A Fenapro, Abap e Apro entregaram à Ancine (Agência Nacional de Cinema), na última semana, uma carta com recomendação de ajustes à Instrução Normativa 95, que aumenta os valores da Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional) em 138% para a entrada de obras audiovisuais estrangeiras no Brasil. O problema está, na realidade, na cobrança de taxas de valores proibitivos para produções de orçamento de até R$ 10 mil. A carta foi assinada por Luiz Lara, presidente da Abap nacional, e leva ainda o timbre da Apro (Associação Brasileira de Produção de Obras Audiovisuais) e da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda). Embora todas as entidades tenham, num primeiro momento, aplaudido a iniciativa de proteger a produção nacional ao estabelecer taxas altas para a entrada de produções estrangeiras, um olhar mais atento à Instrução Normativa 95, de 8/12/2011, revelou que, na tabela vigente da Condecine, as taxas de contribuição valem para produções nacionais em geral, tanto de pequeno quanto de grande porte, sem distinção: R$ 2,38 mil por filme para veiculação na TV aberta e R$ 3,57 mil para veiculação em demais segmentos.
Segundo a carta, endereçada a Manoel Rangel, presidente da Ancine, as entidades Abap, Apro e Fenapro afirmam que deve ter havido um lapso da Ancine ao esquecer que as pequenas produções audiovisuais publicitárias brasileiras são a enorme maioria. “De ponta a ponta, no Brasil, as produções audiovisuais brasileiras são, na sua grande maioria, de pequenos valores e têm uma média de custo de não mais de R$ 5 mil”, diz a carta. Até a validação da IN 95, o mercado de produção de pequeno porte valia-se de outra Instrução Normativa, de número 6, relativa à antiga MP 2228-1, que estabelecia que qualquer titulo/produção de valor inferior a R$ 10 mil deveria pagar apenas cem reais de Condecine. O valor continuou valendo mesmo depois de revogada a instrução, considerada ilegal há cerca de três anos.
O texto da Instrução Normativa 95 não estabelece qualquer desconto para pequenas produções. Além disso, isenta do recolhimento da Condecine apenas obras veiculadas em municípios com menos de um milhão de habitantes. Também houve alteração na quantidade de versões para cada título: as versões de obra audiovisual publicitária serão consideradas um só título juntamente com a obra original, e para efeito do pagamento da Condecine, ficam limitadas a cinco, no caso de obras audiovisuais publicitárias em geral, e 50, no caso de obras audiovisuais publicitárias destinadas ao varejo (antes chegava-se a tolerar até 200 versões para varejo). “Quando a Ancine emitiu um valor nos custos dos filmes importados para proteger o mercado brasileiro – o que foi ótimo, e acredito que todos apoiem isso – ela acabou, numa outra ponta, mexendo nesse setor imenso das pequenas produções”, afirma Gustavo Bastos, sócio da agência 11:21, que trabalha para vários anunciantes de pequeno porte, como Frisa e Recreio. Segundo ele, a Ancine não tinha ideia do tamanho do mercado de filmes de até R$ 10 mil.
A carta explica o tamanho do mercado cinematográfico nacional e o quanto esta cobrança o afetará. Há regiões, como o Nordeste, em que até 85% das produções são de pequeno porte. No Rio de Janeiro, onde o varejo predomina, o volume de pequenas produções também é alto. “É preciso chegar a um consenso a respeito do valor e não impor um aumento absurdo. Se estava errado cobrar somente R$ 100, há de se chegar a uma decisão equilibrada”, ressalta Bastos. Paulo Castro, diretor de criação da Staff, que tem entre seus clientes os supermercados Princesa, afirma que, a partir de fevereiro, certamente a nova taxa começará a afetar profundamente o mercado, principalmente de produção. “O ano está começando e novos filmes devem ser produzidos a partir de fevereiro. Esse número será reduzido, o varejo deve ser profundamente afetado e as produtoras perderão trabalho. Alguns dos comerciais que produzimos não custam nem R$ 3 mil. A taxa Condecine fica mais cara do que o próprio filme. Um trabalho recente para Supergasbras custou R$ 6 mil. Não tem sentido pagar uma taxa tão cara para uma produção tão pequena”, observa.
Segundo o advogado Paulo Gomes, que redigiu a carta à Ancine, a entidade já concordou em criar um benefício para produções de pequeno porte. No entanto, enquanto não acontece a modificação oficial, as novas taxas estarão em vigor. “É preciso inserir na MP 545 a possibilidade de um benefício para as pequenas produtoras. A Ancine definirá se buscará uma alteração na MP atual ou criará uma nova, mas algo só deve ser definido em fevereiro. O que estamos fazendo é orientando agências, produtoras e clientes a criarem versões de um filme original procurando ‘esticar’ o investimento até que esta questão seja resolvida”, diz Gomes. De acordo com o consultor jurídico da Abap, as entidades que representam o mercado de publicidade vai utilizar todos os recursos para chegar no Congresso Nacional e “mostrar a necessidade de se agir rapidamente” para a resolução do problema.
Para a presidente da Apro (Associação Brasileira das Produtoras de Audiovisual), Leyla Fernandes, os novos valores presentes na MP 545 exigiria uma nova atitude do mercado que atua com pequenas produções. “Os trabalhos precisarão de mais planejamento. Diálogo entre agência, anunciante e produtora para aproveitar o mecanismo de versões para o varejo”. Na visão da executiva, a Ancine quis encontrar um equilíbrio para o mercado. Ela reconhece, porém, que o valor ficou salgado. “É pesado para a comparação com as produções regionais. Se fosse uma valor um pouco menor, seria mais saudável, porque não geraria desequilíbrio no mercado”.
Outro item que consta na carta é a recomendação para que se modifique o artigo 5 da Instrução Normativa 95 que estabelece que, para que possa haver a atuação de codireção por estrangeiro de obra publicitária brasileira, é necessário que a produtora brasileira exista há mais de cinco anos e possua registrados sob sua titularidade mais de 300 obras audiovisuais nacionais. “Isso prejudica imensamente alguns mercados menores, principalmente fora de São Paulo”, comenta o advogado João Luiz Faria Netto, que atua junto à Fenapro e a Abap-Rio. Na carta, a exigência é considerada um exagero, e sugere-se que se exija ou que a produtora exista há mais de cinco anos ou que seja titular de mais de 300 obras audiovisuais brasileiras registradas, no lugar das duas coisas juntas.
A executiva da Apro, Leyla, adota uma visão mais pragmática sobre o assunto. Para ela, a ação é mais um esforço da Ancine para equilibrar o mercado. “É uma ação que busca evitar o aventureiro e a estimular que as produtoras tenham uma continuidade. Antes, o setor estava muito aberto”. Ela pondera, contudo, que o número de títulos registrados é alto. Pela discussão, fica a interpretação de que a Ancine quis remediar, mas acabou aplicando uma dosagem elevada demais para o mercado. Ou o tiro saiu pela culatra. (Com informação do propmark)
Deixe seu comentário